28 de fev. de 2014

Eleições 2014: 'Não modifiquei um milímetro a minha posição', diz Tarso Genro

Caroline Bicocchi - Imprensa/Palácio Piratini


Governador do Rio Grande do Sul diz que não modificou um milímetro sua posição em relação à decisão de concorrer ou não à reeleição este ano.


Porto Alegre - O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, disse ao Sul21 nesta sexta (28) que não modificou um milímetro sua posição em relação à decisão de concorrer ou não à reeleição na eleição deste ano. Os dois temas mencionados nos últimos meses como condições para a candidatura à reeleição (a relação da presidenta Dilma Rousseff com seu palanque no RS e a questão da reestruturação da dívida do Estado) tem a ver, disse Tarso, com a necessidade de “dar coerência programática e força eleitoral para a continuidade do nosso projeto aqui no Rio Grande do Sul”.

O chefe do Executivo gaúcho defendeu que fazer o debate da dívida e dos obstáculos internos e externos que o governo federal enfrenta nesta questão não implica divergir da posição de Dilma Rousseff. Tarso acredita que a sociedade precisa se apropriar de temas como o da pressão exercida pelas agências de risco sobre estados soberanos. Ele contou uma história envolvendo um escritor italiano para ilustrar esse assunto:

“O grande escritor italiano Italo Svevo, um dependente do fumo, lutava duramente para livrar-se do vício e colocava o seu drama praticamente todos os dias, em cartas a sua mulher, já que ele trabalhava fora do seu país, a Itália. No fim do ano de 1896, numa das cartas que é apenas uma do seu ciclo de promessas  à esposa, ele escreve a seguinte frase: “estou fumando o último cigarro como prêmio por  ter estado sem fumar até agora”. Fazia um mês que Svevo não fumava.  Creio que esta é uma boa metáfora para a relação dos países com as  chamadas agências de risco, que são empresas privadas que orientam a especulação, o rentismo e os ataques às moedas dos países endividados, estimulando um vício infinito a respeito dos seus prognósticos.  Compartilhar do debate sobre isso não é  dissentir do Governo nem desrespeitar a liderança da Presidenta, mas é ajudar a formar uma massa crítica para, na globalização financeira, ajudar o país a formar uma massa crítica a respeito desta tutela”.

Tarso também comentou a recente passagem da presidenta Dilma pelo Estado e algumas cobranças que recebeu por não ter abordado publicamente o tema da dívida:

“Disse reiteradamente e foi largamente publicado, que não abordaria este assunto com a Presidenta, pois isso poderia soar como uma interpelação e um desrespeito a sua liderança e que esta matéria não é uma matéria exclusivamente do nosso Estado, mas é uma questão importante da Federação. A Presidenta, quando lida com este assunto, está pensando nas relações do país com as pressões internacionais, está pensando na política de juros, está pensando nas contas públicas como conjunto, por isso ela deve falar quando quiser e orientar a sua equipe segundo a visão abrangente que tem do país. Eu, quando lido com este assunto, lido com o destino específico do Rio Grande dentro da Federação e naturalmente  olho o “fenômeno” de outro lugar. A paisagem muda de cor, muda de luz, muda sua aparência, segundo o lugar que você  a observa. O meu entendimento é que o Brasil tem 360 bilhões de dólares de reserva e que  a reestruturação da dívida, sem aumentá-la, não muda nossa situação fiscal. Por isso vou continuar liderando, com outros colegas Governadores,  a luta para a aprovação do Projeto de Lei Complementar que a reestrutura”.

Segundo o governador, as conversas com Dilma, durante sua estada no Rio Grande do Sul na semana passada, trataram de temas como o crescimento industrial do Estado, a visita da presidenta ao Papa, as obras da União e da Copa, a base de apoio dos governos federal e estadual no RS e o cenário internacional. Tarso assegurou que, em nenhum momento, Dilma fez qualquer solicitação para que ele parasse as articulações para a votação do projeto de reestruturação da dívida e tampouco “fez qualquer correção aos meus juízos sobre as agências de risco ou mesmo sobre o que ocorreu no Senado, com a presença do ministro Guido”.

Ter pontos de vista diferentes sobre uma questão financeira específica, assinalou ainda,  “não significa conflito nem desarranjo nas relações políticas”. E acrescentou:

“De mais a mais,  todos estamos conscientes que a nossa estratégia geral  visa é a  reeleição da Presidenta, para que o Brasil continue mudando para melhor e possa, o Governo, enfrentar no próximo mandato, os novos desafios que o movimento social vem propondo de maneira bem acelerada, principalmente a questão da saúde e do transporte coletivo nas grandes regiões metropolitanas”.

Tarso abordou também a questão de sua candidatura ou não à reeleição, garantindo que não está fazendo qualquer tipo de imposição para anunciar sua decisão:

“O que a crônica política  chamou de condições, para a minha candidatura, como se eu estivesse fazendo uma imposição, são, na verdade,  pré-requisitos de viabilidade  eleitoral, pois reiteradamente tenho colocado que, o que  se trata é de dar coerência programática e força eleitoral para a continuidade do nosso projeto, aqui no Rio Grande do Sul”.

E destacou os ganhos que o Estado já teve pelo alinhamento político com o governo federal:

“Isso tem sido ótimo para o Rio Grande do Sul, não só pelo volume de obras da União, mas também pelos financiamentos obtidos pelo nosso Governo, acordados  diretamente com a Presidenta e, em segundo lugar,  por que sem a reestruturação da dívida  não poderemos obter novos financiamentos, principalmente para infraestrutura e, ao não obtê-los,  o nosso segundo governo não teria a mesma força para impulsionar o crescimento do Estado, com distribuição de renda”.

Sobre a decisão de concorrer ou não concorrer, afirmou:

“Não modifiquei um milímetro a minha opinião sobre isso nem sobre a viabilidade de apresentar o meu nome, sem estas condições. Tenho advertido ao Partido, pela sua direção nacional, que o Rio Grande não pode ser analisado como outro Estado qualquer,  no que toca aos processos eleitorais. O que fará maioria para Dilma, aqui, é o seu Governo, é a atenção que ela está dando ao Rio Grande, é o seu bom Governo. É a ação militante da esquerda, do PT, do centro progressista e democrático.  É claro que,  quanto mais partidos estiveram apoiando-a,  melhor será para a soma de votos. Mas não é, substancialmente,  o apoio de siglas que transfere votos aqui no estado”.

Tarso observou que na eleição de 2010 teve apoio só do PT, PSB e PC do B.
“Ganhei a eleição no primeiro turno, praticamente com quem, na época, era identificado com a esquerda pura”. E definiu o seu governo como um Governo de esquerda que, como tal, tem algumas tarefas bem definidas na atual conjuntura nacional e internacional: democratizar a relação Estado-sociedade com um novo sistema de participação popular cidadã, promover o desenvolvimento com geração de renda e emprego, desenvolver políticas públicas que, no âmbito do território, possam inclusive sinalizar um novo passo para o projeto nacional.

Para isso, acrescentou, “é preciso ter recursos para investir em políticas sociais de combate à pobreza, formação profissional, impulsionar os investimentos privados através da democratização dos incentivos, subsidiar o avanço científico-tecnológico,  aumentar a renda dos assalariados do Estado e das empresas privadas, assim fortalecendo novos sujeitos sociais no âmbito da revolução democrática”. “Se não puder se fazer isso não vale a pena governar. Como eu acho que vale a pena governar e se pode fazer coisas muito boas para fortalecer a democracia, que está em crise em, todo o mundo, vou continuar brigando para criar estas condições”, anunciou.

Conversa de candidato? O governador disse que sabe que muita gente não acredita que ele não tem nenhuma ambição pessoal de reeleição. Sobre isso, afirmou:

“É claro que um militante político como eu, de esquerda, que aprendeu muito,  principalmente nos últimos 35 anos, que valoriza a ocupação de mandatos para levar a termo as suas lutas, pode e deve concorrer as eleições. Mas esta ‘concorrência’ deve estar vinculada a avanços, a construção de coisas novas, especialmente para melhorar a vida dos que o velho Florestan Fernandes chamava dos de baixo.  Isso, hoje,  se faz por reformas e por políticas públicas de coesão social, crescimento e emprego”.

Tarso disse ainda que não conhece nenhuma força política, hoje, que concorra nas eleições periódicas, que não seja reformista, por mais radical e artificial que seja a sua linguagem, mesmo que no interior dos seus organismos a democracia seja tratada apenas como uma questão tática.  “Ninguém ousa dizer que quer destruir o Estado Democrático de Direito, uma conquista fundamental do povo brasileiro, que é o ponto de partida de uma democracia de conteúdo, de uma democracia substantiva, que, para nós, pelo menos de uma grande parte do PT, se chama socialismo”.

Por fim, o governador admitiu que grupos de esquerda mais radicais podem trazer alguma contribuição para a esquerda que está em governos:

“O  revolucionarismo romântico, que seguidamente aparece nos processos históricos, principalmente através de grupos que tem muita estética, pouco conteúdo e nenhum programa capaz de seduzir e organizar os trabalhadores, é um elemento vital de democratização da democracia. Ele normalmente acorda os acomodados e corrige governos que tendem a perder a imaginação e o rumo”.

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