O Partido dos Trabalhadores (PT) realiza neste final de semana, em Brasília, o seu 4º Congresso Nacional. Cerca de 1.350 delegados, eleitos pelo voto direto de filiados em todo o país, participam. Eles devem votar amanhã a Resolução Política proposta pela Executiva Nacional do PT. São 116 pontos, vários dedicados à questão dos meios de comunicação no Brasil.
No começo desta tarde de sábado, entre uma atividade atrás da outra, Elói Pietá, secretário-nacional do PT, abriu uma brecha, espremida, para esta entrevista sobre um tema fundamental para a democracia brasileira: a regulação dos meios de comunicação.
Gaúcho de Guaurama e morador de Guarulhos, na Grande São Paulo, desde 1980, Elói Pietá já foi vereador, deputado estadual e duas vezes prefeito de Guarulhos. Terminou o segundo mandato com 80% de aprovação. Atualmente Elói Pietá é vice-presidente da Fundação Perseu Abramo.
Viomundo – A proposta de resolução do IV Congresso Nacional do PT tem 116 tópicos. Entre eles, o marco regulatório dos meios de comunicação no Brasil. O que levou o PT a incluí-lo na pauta? Teria a ver com o caso Veja/ex-ministro José Dirceu?
Elói Pietá – Não, não. Historicamente o PT tem defendido a democratização da mídia. Há toda uma tradição nossa nesse sentido, desde 1989. E, até devido à crescente importância da internet como instrumento de comunicação, esse é um tema que está de volta no mundo todo com muita força.
O marco regulatório é um avanço da democracia e nós, que somos governo há 8 anos e 8 meses, devemos isso ainda ao Brasil. Então, retomando aquela perspectiva levantada desde a campanha para presidência da República de 1989, o PT vai agora transformar essa questão em uma de suas prioridades. Será uma das prioridades da nossa ação partidária. Portanto, não tem nada a ver com o episódio recente.
Viomundo – A proposta de regulação da mídia já foi votada?
Elói Pietá – Não, vai ser votada amanhã pela plenária. A proposta de resolução do 4º Congresso do PT tem 116 itens, há alguns que abordam essa questão.
Viomundo – Por que é importante o Brasil regular os meios de comunicação?
Elói Pietá — Nós achamos que há duas questões básicas para o avanço da democracia no Brasil: a reforma política e a democratização da comunicação.
Hoje os principais meios de comunicação estão nas mãos de poucas empresas. E essas poucas empresas têm veículos de comunicação nas diversas mídia. Portanto, um setor privado muito restrito, bastante concentrado, que assumiu um quase monopólio da área de comunicação de massa, o que não é muito adequado à democracia.
Viomundo – Por quê?
Elói Pietá – Porque essas empresas não têm mandato outorgado pela sociedade para serem juízes do que do que a população deve saber. Portanto, esse setor tem de se abrir para que a sociedade tenha acesso a informação mais plural, mais diversificada. Atualmente, essas poucas empresas têm condições de censurar o pensamento de setores importantíssimos da sociedade.
Viomundo – Mas essas empresas alegam que a regulação é que seria censura. Aliás, sempre que o assunto entra em pauta, a mídia fala em atentado à liberdade de imprensa, à liberdade de expressão, em censura. O que o senhor acha desse discurso?
Elói Pietá – São eles que têm o poder de censura e o fazem hoje. Nós não queremos censura. Nós queremos que a abertura das comunicações permita-nos superar a censura que pode ser feita atualmente por poucas empresas.
Você pode dizer: todo mundo tem direito à livre expressão. Ok, concordo. O problema é que não está sendo assegurado o direito dessa livre expressão chegar ao conhecimento da sociedade.
Só chega à sociedade um lado da história, o lado dos donos das poucas empresas de comunicação. Portanto, isso se constitui numa censura a outras opiniões, propostas, interpretações. Até o peso desigual que se dá ao fato na sua divulgação à sociedade pode se constituir em censura.
Outro ponto importante é a disseminação do acesso à internet. Isso também faz parte daquilo que chamamos marco regulatório. Assim como nós levamos luz elétrica à regiões mais distantes, isoladas do Brasil, no governo Lula e agora também no governo Dilma, nós queremos que o mesmo aconteça com a internet.
Viomundo – O que o PT propõe em relação ao marco regulatório?
Elói Pietá — Na verdade, tem vários aspectos. Por exemplo, a questão de proibição da propriedade cruzada nos meios de comunicação. A possibilidade de as rádios comunitárias terem acesso à sua legalização. O fortalecimento das redes públicas de comunicação que podem ter papel importante nas questões de educação, saúde e cultura. Outro elemento importantíssimo é garantir espaço para a produção cultural nacional. É uma forma de a nossa produção cultural chegar ao povo brasileiro, mas também a outros países.
Enfim, um conjunto de elementos que significa uma mudança marcante, histórica, de uma legislação que vem da época de 60 e está em vigor até hoje.
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Dos 116 tópicos da Resolução Política do 4º Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores, quatro (de 73 a 76) dizem respeito à regulação dos meios de comunicação. Seguem abaixo:
73. Para o PT e para os
movimentos sociais, a democratização dos meios de comunicação é tema
relevante e um objetivo comum com os esforços de elaboração do governo
Lula e os resultados da I Conferência Nacional de Comunicação, que
evidenciou os grandes embates entre agentes políticos, econômicos e
sociais de grande peso na sociedade brasileira. É urgente abrir o debate
no Congresso Nacional sobre o marco regulador da comunicação social –
ordenamento jurídico que amplie as possibilidades de livre expressão de
pensamento e assegure o amplo acesso da população a todos os meios
sobretudo os mais modernos como a internet. Daí o nosso repúdio ao
projeto de lei 84/99 que se originou e tramita no Senado Federal, o AI-5
digital, pois pretende reprimir a livre expressão na blogosfera.
74. Para nós, é questão
de princípio repudiar, repelir e barrar qualquer tentativa de censura ou
restrição à liberdade de imprensa. Mas o jornalismo marrom de certos
veículos, que às vezes chega a práticas ilegais, deve ser
responsabilizado toda vez que falsear os fatos ou distorcer as
informações para caluniar, injuriar ou difamar. A inexistência de uma
Lei de Imprensa, a nãoregulamentação dos artigos da Constituição que
tratam da propriedade cruzada de meios, o desrespeito aos direitos
humanos presente na mídia, o domínio midiático por alguns poucos grupos
econômicos tolhem a democracia, silenciam vozes, marginalizam multidões,
enfim criam um clima de imposição de uma única versão para o Brasil. E a
crescente partidarização, a parcialidade, a afronta aos fatos como
sustentação do noticiário preocupam a todos os que lutam por meios de
comunicação que sejam efetivamente democráticos. Por tudo isso, o PT
luta por um marco regulatório capaz de democratizar a mídia no País.
75. As reformas
institucionais não estarão completas se não forem acompanhadas da mais
profunda democratização da comunicação. Além de tudo isso, as mudanças
tecnológicas e a convergência de mídias precisam ser acompanhadas de
medidas que ampliem o acesso, quebrem monopólios e garantam efetiva
pluralidade de conteúdos.
76. Ainda no campo da
comunicação, é preciso aprofundar as políticas públicas para a
juventude, num contexto em que a própria noção de cidadania cultural se
redesenha num cenário de convergência tecnológica, de economia e de
serviços. Tais políticas devem voltar-se para a ampliação da fruição
cultural e da qualidade da educação no Brasil.
Editado por Eri Santos Castro.
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