20 de set. de 2009

Pausa no caos para falar de poesia

Em meio ao barulho e à profusão de informações inerentes a qualquer Bienal do Livro, três poetas se reuniram nesta sexta-feira no Café Literário para falar sobre o tempo desacelerado exigido pela poesia. Para Ferreira Gullar, Eucanaã Ferraz e Claudia Roquette-Pinto, é difícil predizer o futuro dos versos, mas eles sempre existirão enquanto houver Humanidade e vida a ser inventada.

— A gente faz poesia porque a vida é pouca, não basta — afirmou Gullar, dando um exemplo concreto de por que a poesia é necessária. — Eu conheci um economista peruano, casado com uma morena brasileira, e sempre que nos encontrávamos ele falava de economia. Um dia, a morena foi embora. Ele se sentou do meu lado e falou de poesia inglesa, francesa. A poesia sobrevive porque infelizmente um dia a morena vai embora — disse, arrancando gargalhadas da plateia.

Eucanaã disse que, mais do que silêncio e concentração, a poesia exige "maturidade existencial" e que, por mais que mude de tempos em tempos, lida sempre com as mesmas questões, os mesmos sentimentos. E que isso vale também para o poeta, que, mesmo ao se reinventar, não consegue fugir do que é:

— A gente leva um tempão para encontrar nossa voz e depois dizem que estamos nos repetindo. Eu custei a encontrar o meu número, quanto encontro tenho que mudar de roupa? Ser o que eu sou não é repetição. Isso é existir. Ser se é. E não se é gratuitamente, nem de um dia para o outro. Lendo o Gullar, parece que são vários poetas... Ao mesmo tempo, é o mesmo. Ele muda para ficar igual. Como disse Mario Quintana: "A minha vida é uma colcha de retalhos, todos da mesma cor".

Perguntado pela mediadora do debate, Suzana Vargas, sobre se há vanguardas hoje, Gullar disse que não, porque elas foram um fenômeno do século XX. Para ele, toda arte tem algo de novo, mas não precisa ser vanguarda. Ele contou ainda que não entende nada de grande parte da poesia que é feita atualmente. Questionado por um espectador sobre se se incomodava com o novo, ele foi categórico:

— Eu adoro o novo, me incomodo com o ruim.

Suzana Vargas situou Eucanaã e Claudia na "geração 90", de poetas mais intelectualizados, que romperam com a poesia marginal e resgataram uma preocupação com o rigor. Para ambos, era uma resposta da sua época às perguntas da sua época, quando já não fazia mais sentido ser combativo, e sim restaurar um tanto de delicadeza e cuidado formal.

— A geração anterior era bem perto da vida, bem suja, queria tirar a poesia da torre de marfim. E nós estávamos preocupados com o verso, com a musicalidade, e também fomos criticados, como se isso esfriasse a poesia — afirmou Claudia.

Ao final, Gullar e Eucanaã discordaram sobre a possibilidade de se ensinar poesia. Enquanto para Gullar essa é uma tarefa impossível, pois depende de vocação, Eucanaã disse que, assim como um curso de arquitetura não ensina a ser um Oscar Niemeyer, um curso de poesia não ensinará alguém a ser genial, mas pode contribuir para a formação de um escritor.

— Quando pego um livro, sei logo se o cara é poeta. O livro pode nem estar pronto, mas existe um modo de lidar com a palavra, que é diferente em cada poeta, mas que ao mesmo tempo é próprio a todos. A poesia quase não é literatura. É uma coisa que nasce do espanto. É claro que há um saber fazer, mas ele não é suficiente — afirmou Gullar.

— Concordo, mas há pessoas que aprendem a fazer música, atores aprendem a atuar. Parece que só a poesia não pode. Talvez seja possível, sim — disse Eucanaã, para depois ressaltar: — É difícil porque, em poesia, não há nenhum conselho que você possa dar que você não possa dar o contrário depois.

— É por isso mesmo que não se pode ensinar. Cada poeta faz sua própria regra — insistiu Gullar.
Por Suzana Velasco.
Enviado por Eri Santos Castro.

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