27 de out. de 2008

A Crise: desaparecem evidências

Num primeiro momento, até parecia que a crise era um (enorme) problema financeiro e que a sua solução teria que ser financeira: injeções de biliões e biliões de dólares e de euros no sistema bancário; nacionalizações de alguns bancos e seguradoras; coordenação entre os maiores bancos centrais para descerem taxas de juro; garantias bilionárias estatais em vários países (incluindo Brasil) para evitar que os bancos acabassem por parar o crédito.

Também logo com o desencadear da crise se começou a proclamar que a origem do imbróglio estava nas falhas dos “reguladores” (bancos centrais e nacionais, organismos de supervisão). E é verdade: basta reparar no exemplo da Islândia, cujos maiores bancos – que tiveram que ser nacionalizados – estimularam o consumismo e “investiram” tanto (até num clube de futebol inglês!) que provocaram uma dívida superior a 10 vezes o PIB do país, e durante toda essa euforia, nem o banco central nem o governo islandeses foram capazes de “regular” o processo

Mas isto (falhas de regulação) não é toda a verdade! É que, desde o fim dos anos 80, estados, governos, instituições internacionais (por exemplo, o Fundo Monetário Internacional) fizeram parte do coro que cantou as maravilhas da liberalização “à outrance”, da eficácia do “jogo” do mercado, do quanto menos regras e sobretudo quanto “menos Estado” melhor.

Ora, uma conclusão começa hoje a sobressair com mais força: o mercado e especialmente a globalização financeira não podem continuar desregulados ou com regras tão flexíveis que permitam “produtos” e jogos de compra-vende que a crise veio por a nu.

Cada vez mais gente desconfia da “auto-regulação”. Portanto: a “evidência” de que o mercado é que dita as regras perdeu a sua aura de verdade absoluta. Foi-se! Mas a crise também tende a desmentir o que o discurso dominante desejaria que fosse evidente: que o problema é de funcionamento do sistema financeiro e que as soluções encontrar-se-ão em melhores regras para o funcionamento do sistema. Só que a crise é mais funda: não é só técnico-política.