Maio 68, ponto culminante de um longo ciclo de lutas sofisticadas
Parte 1
Depois de Maio 1968, ponto culminante de um longo ciclo de lutas, tanto nos países do centro como nos da periferia, a forma dos movimentos de resistência e de libertação conheceu uma transformação progressiva e profunda, fazendo-se eco das alterações surgidas no mesmo período na organização das forças produtivas e nas formas de produção social. Podemos começar por situar essa alteração nas mutações que afetaram a natureza da guerrilha. A alteração mais banal prende-se com o fato dos movimentos de guerrilha passarem das aldeias para as cidades, dos espaços abertos para os espaços fechados. As técnicas de guerrilha foram progressivamente adaptadas às novas condições definidas pela produção post-fordista, como os sistemas de informação e as estruturas em rede. De certa forma, à medida que ela adapta as características da produção biopolítica e se derrama por todo o tecido social, a guerrilha configura como objetivo principal a produção de subjetividade- uma subjetividade quer econômica e cultural, quer material e imaterial. Não se trata somente de " conquistar a luta pelos corações e os espíritos ", mas mais concretamente, de criar corações e espíritos novos produzindo novos circuitos de comunicação, novas formas de colaboração social e novos modos de interação.
Neste processo exprime-se uma tendência para a ultrapassagem do modelo de guerrilha moderna em prol de organizações mais democráticas. Uma das características comuns às lutas reticulares da multitude e também da produção económica post-fordista é o fato delas terem lugar no terreno biopolítico- noutros termos, elas produzem diretamente novas subjectividades e novas formas de vida. É verdade que as organizações militares implicaram sempre a produção de subjetividade. O exército moderno produziu o soldado disciplinado da fábrica fordista, e a produção do sujeito disciplinado da guerrilha moderna não foi essencialmente diferente desse modelo. A luta em rede, ao contrário, da mesma forma que a produção post-fordista, não depende de certa maneira da disciplina: os seus valores cardeais são a criatividade, a comunicação e a cooperação auto-organizada .