Jornal GGN –
Mais de cinco anos se passaram desde o início dos protestos no Oriente Médio,
que ficaram conhecidos como Primavera Árabe. As revoltas foram desencadeadas
contra presidentes que estavam entre 20 e 40 anos no poder. Mas as condições
para os conflitos tinham motivações sociais: alto desemprego e economias
estagnadas. Terreno ideal para o incentivo norte-americano, estrategista no
investimento de milhões de dólares na disseminação de sua ideologia.
Zine al-Abidine
Ben Ali estava há mais de 20 anos no poder da Tunísia, Hosni Mubarak há 30 no
Egito, Muammar Khadafi governou a Líbia por 42 anos, e Bashar al-Assad sucede o
governo de 30 anos de seu pai na Síria, país que até hoje é palco de guerra
civil, obrigando ao deslocamento de boa parte de sua população, agora na
condição de refugiados pelo mundo.
Mas não foi pelo
meio bélico que os Estados Unidos defendeu seus interesses nos países orientais
em 2011. A essa outra forma de "ataque", o estrategista militar
norte-americano Thomas Barnett denominou antecipadamente "sistemas
administradores", na apresentação da Technology, Entertainment, Design
(TED) 2005, intitulada "The Pentagon’s New Map for War & Peace".
O "ataque" é efetivado em países alvos de desestabilização econômica
ou social, e ocorre por meios de comunicação, jornais, ONGs, redes sociais,
ativistas, empresários, organizações.
Se condições
similares são encontradas, atualmente, no Brasil, há quem defenda que não são
coincidências.
Para entender
como a geopolítica dos Estados Unidos atua, o GGN conversou com o cientista
político Luiz Alberto Moniz Bandeira, autor de mais de 20 obras, entre elas
"A Segunda Guerra Fria - Geopolítica e dimensão estratégica dos Estados
Unidos" (2013, Civilização Brasileira). Aos 80 anos,
lança mais um livro em maio deste ano, "A Desordem Internacional".
"A crise
hoje no Brasil é dimensionada de forma tão absurda como está ocorrendo porque
os Estados Unidos não admitem a emergência de outra potência na América do
Sul", afirmou. O pesquisador trouxe detalhes de como instituições
norte-americana trabalham:
"não é
somente a CIA. (...) As ONGs, financiadas pelo dinheiro oficial e semioficial,
como a USAID e a National Endowment for Democracy, atuam comprando jornalistas,
treinando ativistas. O programa da Primavera Árabe foi elaborado, ainda, no
tempo de George Bush", contou.
Para o Prof.
Moniz Bandeira, o mesmo está sendo feito no Brasil.
Acompanhe
a seguir e nos vídeos alguns trechos
da entrevista:
GGN – Sobre essa
nova geopolítica americana nas guerras nos países árabes, de que maneira que se
dava a estratégia de insuflação, o uso de redes sociais?
Moniz Bandeira – Os Estados Unidos têm como objetivo os
neoconservadores. São eles que hoje compõem o principal segmento do partido
republicano, infiltrado no partido democrata também, porque o [presidente
Barack] Obama manteve esses neoconservadores no seu Departamento de Estado. O
objetivo é o domínio completo, espaço, área de todo o universo. O domínio
total.
E é preciso
compreender que a crise hoje no Brasil é dimensionada de forma tão absurda como
está ocorrendo, porque os Estados Unidos não admitem a emergência de outra
potência na América do Sul. A questão básica hoje está na moeda.
A Rússia, assim
como a China, estão empenhados em acabar com a predominância do petrodólar.
Criar outro sistema financeiro internacional. Estão a fazer isso. Estou expondo
isso com detalhe no meu novo livro, que vai sair em maio, A Desordem Internacional.
Os Estados
Unidos, quando não podem dominar, criam um caos. Agora, é preciso compreender
que isso não é somente a CIA. A CIA gasta cerca de 80% do seu orçamento – que aliás,
ninguém sabe, porque além do que há da ação oficial, ela tem empresas, até de
agências de viagens, então tem um dinheiro muito diluído -, mas 80% que gasta
do dinheiro oficial é em operações secretas. Isso já há muito tempo. Ao invés
de coletar inteligência.
Porém, hoje, os
Estados Unidos usam outras instituições. As ONGs, financiadas não só pelo
dinheiro oficial e semi-oficial, como a USAID [United States
Agency for International Development] e a NED [National
Endowment for Democracy], comprando jornalistas, treinando ativistas,
pesquisadores. Há programa sobre isso. Esse da Primavera Árabe foi elaborado,
ainda, no tempo de Bush.
Na Ucrânia, os
cursos foram dados dentro da Embaixada dos Estados Unidos. Isso está tudo
documentado.
GGN – Que tipo
de conteúdo eles davam nesses cursos?
Moniz Bandeira – O tema é defesa da democracia, combater a
corrupção. São temas que sensibilizam a classe média, mobilizam. Essas
instituições não atuam no vazio. Sempre, claro, as condições existem. No
Oriente Médio, há um desemprego muito grande, as economias estagnadas,
desemprego, sobretudo, para os jovens, que se formam, se educam, mas não
encontram emprego.
GGN – Nessa
intervenção por meio de ONGs e ativismo político, todas as pessoas que eram
ensinadas ou Organizações tinham conhecimento ou era uma forma de manipulação
não explícita?
Moniz Bandeira – Eles financiam a criação dos jornais e blogs na
internet, e rádios. Uma rádio foi criada em 2009, na Síria, mas funcionava na
Inglaterra, com dinheiro americano. Os Estados Unidos destinaram na Síria, isso
tudo documentado, entre 2005 e 2010 cerca de US$ 12 milhões. O orçamento de
2005 para 2006 foi de US$ 5 milhões.
GGN – A partir
de 2002, após o atentado das Torre Gêmeas, teve a chamada Cooperação
Internacional, que juntou o Ministério Público e as Polícias Federais de todos
esses países para combater o crime organizado. Você chegou a analisar de que
maneira os Estados Unidos estão se valendo disso, também, para as suas
estratégias geopolíticas?
Moniz Bandeira –
Eles faziam treinamentos como os militares na Academia do Panamá. Hoje eles não
contam mais com os militares. Depois das ditaduras, eles viram que elas não
deram certo. Por um lado, desmoralizaram os Estados Unidos, por causa dos
direitos humanos. Por outro, os militares, de uma forma ou de outra são
patriotas. Eles não estavam muito para o comunismo, mas não queriam ser
submissos aos Estados Unidos. No Brasil, principalmente, no Peru, e mesmo na
Argentina.
Eu tenho uma
pesquisa em um dos livros meus sobre o voto do Brasil desde 1968 até o fim da
ditadura. O Brasil votou muito mais vezes com os países neutros, e a União
Soviética, a favor dos Estados Unidos. Eu tenho isso listado no livro
"Brasil – Estados Unidos: a rivalidade emergente", quando eu estudo o
regime militar. Inclusive, não obstante à custa dos direitos humanos, a
Argentina também votou contra.
Eu não tenho
dúvida de que no Brasil os jornais estão sendo subvencionados. De uma forma ou
de outra, não sei como, mas estão. Não posso provar, mas é possível que por
trás disso estejam as fundações de George Soros, que dão dinheiro aos
jornalistas. Há jornalistas honestos. Mas há outros que estão na lista de
pagamentos. Muitos desses jornalistas que eu sei estão nos Conselhos Fiscais de
várias empresas estrangeiras. Ganham dinheiro com isso, escrevem no O Globo e
em outros jornais.
Outro dia, o
diretor geral da Polícia Federal declarou que muitos policiais, comissários e
outros recebiam dinheiro da CIA diretamente em suas contas. Este é um conluio que
devia acabar.
Por detrás disso
tudo, não tenha dúvida que estão os recursos da USAID, que é um instrumento da
National Endowment for Democracy, e das Fundações, que são várias, dos Soros e
outras, por exemplo, que se opõem a certas construções de hidrelétricas no
Brasil. Elas estão a serviço de empresas alemãs e usam como pretexto, sempre, a
proteção da natureza, meio ambiente. A USAID, onde ela trabalha? Trabalha fora
da embaixada. É uma organização "semi-oficial". A National Endowment
for Democracy é financiada pelo Congresso, mas é também fora, recebe dinheiro
do Congresso americano.
GGN – Se a gente
pega a estrutura de poder dos Estados Unidos, falando da CIA, etc, não tem diferenças de orientação entre, por exemplo, o FBI, o
Departamento de Estado, Departamento de Justiça?
Moniz Bandeira – Os Estados Unidos é um país muito complexo e
contraditório. Isso está evidente na campanha eleitoral onde Sanders é dado
como progressista, enquanto que, por parte dos republicanos, você vê a
decadência. O Trump, em primeiro lugar, por que? Porque os outros são de Bush
para pior. O Trump é maluco. Porém, a figura é o retrato da situação.
Quando recebi o
Doutor Honoris Causa da Universidade da Bahia, eu disse que uma potência é
muito mais perigosa quando está a perder a hegemonia do que quando constrói o
seu império. Quando constrói o império, ela necessita ser aceita. Mas quando
está perdendo...
Como agora, os
Estados Unidos não dominam mais, não têm mais o poder que tinham antes. Eu digo
poder, porque, por exemplo, não influi mais sobre Israel. Os assentamentos
continuam, não obstante a oposição dos EUA. Porque o lobby judaico dos Estados Unidos não deixa. E o governo de Israel mantém os
assentamentos porque, realmente, não admite que haja dois estados. Isso,
ideologicamente, já vem de muitos anos. Os Estados Unidos querem que todas as
ideias sucumbam.
Do sítio grupo Beatrice, confira aqui!
Enviado por Eri Santos Castro.
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