Matéria interessante da Época: a mídia contraditória.
De onde vêm, o que querem e como agem os jovens que foram às ruas protestar contra o aumento das passagens do transporte público
>>Este texto faz parte da edição de ÉPOCA desta semana. Na revista que chega às bancas no fim de semana, saiba mais sobre esses jovens.
Quinta-feira à noite na cidade de São Paulo. Bares, restaurantes e casas noturnas costumam fazer de alguns bairros paulistanos referências mundiais de entretenimento noturno, numa prova de que a capital paulista não dorme. Quando o paulistano não trabalha, está se divertindo. Tal organismo pulsante de luz e vida tem uma medula, a Avenida Paulista. Às 22 horas da última quinta-feira, dia 13, o mais conhecido cordão de asfalto da cidade estava silencioso, tomado por uma fina névoa de gás lacrimogêneo. Como no início do século passado, cavalos percorriam a via pública em galope desabalado. Talvez como sinal dos tempos, os animais eram comandados por integrantes do Regimento de Cavalaria 9 de Julho da Polícia Militar. Junto dos batalhões de choque, da Força Tática e da Rota, a cavalaria expulsava quem tentasse passar pela avenida. A Paulista se transformara numa zona militarizada. A PM reafirmava sua autoridade, após umviolento confronto com militantes do Movimento Passe Livre (MPL), que fazia seu quarto protesto contra o aumento da passagem de ônibus na cidade neste mês.
Os manifestantes, jovens em sua maioria, haviam chegado à Paulista por volta das 21 horas em três grupos – pelas ruas Augusta, Haddock Lobo e Bela Cintra. Vinham do centro de São Paulo, empunhando cartazes contra a elevação de R$ 3 para R$ 3,20 nas tarifas de transporte público. Como se comemorassem a conquista de campeonato de seu time do coração, cena comum para o local, entoavam ataques ao prefeito Fernando Haddad (PT), ele mesmo um militante estudantil em seus tempos de aluno de Direito na Universidade de São Paulo, nos anos 1980: “Dança, Haddad, dança aqui até o chão; aqui é o povo unido contra o aumento do busão”. Motoristas e pedestres assustados tentavam correr dos manifestantes. Carros pegavam a contramão na movimentada avenida, em sinal de pânico. Dois dias antes, outro protesto deixara um rastro de destruição, com estações de metrô e pontos de ônibus depredados – além de agências bancárias.
Pouco antes do protesto de quinta-feira, a Polícia Militar de São Paulo, subordinada ao governador Geraldo Alckmin (PSDB), decidira que, em hipótese alguma, permitiria que o protesto chegasse mais uma vez à Paulista. “Eles (manifestantes) tinham concordado com esse entendimento”, disse Alckmin ao explicar a ação violenta de policiais para interromper o protesto. Se concordaram, mudaram de opinião. A presença na Paulista foi claramente definida por integrantes do movimento como um objetivo a atingir. Alckmin tomou a decisão de ser duro na repressão em comum acordo com Haddad e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, numa rara união entre autoridades tucanas e petistas. Juntos, eles também decidiram não recuar em relação ao novo preço da tarifa de transporte, implantado no último dia 2 e válido para ônibus, metrô e trens da capital. A inusitada parceria dos adversários políticos é um sinal da surpreendente força adquirida pelos protestos e seus organizadores, o Movimento Passe Livre.
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